Ele dormia completamente nu, o clima do lugar não cedia escolha. Apenas uma fresta deixava o ar quente e seco entrar pela janela de seu caminhão. Conseguir dormir, fechado naquele espaço pequeno, era quase impossível, o ar parecia não chegar aos pulmões.
Acordou com um pulo assustado, respirando o pouco ar que havia ali dentro, com o coração batendo rápido e acelerado. O caminhão estava sacudindo nervosamente. O primeiro pensamento que lhe veio à cabeça foi o de que alguém mal intencionado estava tentando entrar a força. Ou então um terremoto – mas um terremoto, aqui? pensou -. Vestiu suas calças e saiu sem camisa, sentiu a pele arder ao contato com o sol, olhou ao redor e nada de diferente estava acontecendo, o mesmo clima e terra, secos e cálidos, continuavam imóveis, não havia nenhum sinal de terremoto. Voltou o olhar para o caminhão, que continuava balançando, de um lado para o outro, ninguém estava tentando entrar à força. Deu a volta pela frente do caminhão e se deparou com uma cena inusitada que ficaria em sua memória por um bom tempo, uma mula coçava o traseiro no pára-choque do caminhão, nervosa, como se algo a estivesse incomodando.
Sorrindo, descansou as mãos na cintura e ficou estudando a mula por alguns longos instantes.
Espantou o animal dali e voltou para dentro do caminhão sentando-se atrás do volante. Encarou o horizonte da rodovia, infinita, mas com destino final. Pensou em seus filhos, já fazia três meses que não os via, a saudade estava ferindo-lhe de um jeito quase insuportável. Desviou o olhar e encarou-se num pequeno espelho, viu sua pela queimada do sol, seus cabelos grisalhos, viu em seu rosto longos anos de trabalho, sentiu uma lagrima correr-lhe pelo rosto. Ligou os motores e partiu, deixando para trás uma nuvem de terra seca e as marcas de pneu na estrada.